O que é Ciência Contemplativa
Ciência Contemplativa: Onde o Budismo e a Neurociência se encontram Estamos em uma época onde os limites entre ciência e espiritualidade, mente e corpo, conhecimento e sabedoria estão sendo profundamente revisitados. Tenho a sensação de que, apesar de todo o avanço tecnológico e científico, ainda nos falta algo fundamental para entender quem somos e, como podemos viver uma vida plena (de verdade). Isso ressoa em você? A ciência moderna nos deu ferramentas incríveis para explorar o mundo exterior, desde as partículas subatômicas até as galáxias distantes. Mas quando o assunto é o nosso universo interior, a mente, a consciência, as emoções; parece que estamos em um território muito desconhecido. Por muito tempo, a ciência e as tradições espirituais seguiram caminhos separados, quase opostos. B. Alan Wallace, em seu livro Ciência Contemplativa (2009), nos convida para essa reflexão: “A força que a ciência adquiriu ao se divorciar da religião, e mais recentemente da filosofia, impôs um pesado tributo a suas sociedades hospedeiras. É importante observar que o século XX, que gerou o mais vasto conhecimento científico de todo o curso da história da humanidade, também testemunhou a maior desumanidade para com o homem, como também a maior degradação do meio ambiente e dizimação de outras espécies. A expansão do conhecimento científico não trouxe nenhum crescimento comparável em termos de ética e virtude. Em consequência disso, a sociedade moderna adquiriu mais conhecimento e poder, mas não mais sabedoria e compaixão.” É com essa reflexão e motivação que ele propõe uma nova ciência: A Ciência Contemplativa. O Que É Ciência Contemplativa? A Ciência Contemplativa emerge nesse cenário como uma proposta revolucionária: unir o rigor do método científico à profundidade milenar das tradições contemplativas, especialmente da psicologia budista. Mais do que um novo campo acadêmico; a ciência contemplativa é um convite para a investigação a partir da experiência direta, com clareza, estabilidade e compaixão. Um campo transdisciplinar que propõe uma nova forma de investigar a mente, a realidade, colocando a experiência subjetiva no centro da pesquisa, com o olhar atento e criterioso da ciência contemporânea. Segundo B. Alan Wallace, o proponente dessa abordagem, a ciência contemplativa é um campo interdisciplinar que une psicologia, neurociência, filosofia da mente e práticas contemplativas para estudar a natureza da consciência, do sofrimento e do florescimento humano. Sabemos que a ciência tradicional é baseada na observação em “terceira pessoa”, ou seja, observamos algo “lá fora”, de forma objetiva e mensurável. Isso funciona bem para estudar o movimento dos planetas, a estrutura de uma célula, e tantas outras coisas tangíveis e materiais. Mas como estudar a experiência da alegria, da tristeza, ou a natureza da consciência usando essa abordagem? Por esse motivo, diferente da ciência ocidental tradicional, que se baseia exclusivamente na observação externa e objetiva, a ciência contemplativa valoriza também a observação em primeira pessoa; ou seja, o estudo da mente a partir da experiência direta vivida. Ela é, portanto, uma forma de investigar a realidade que integra três elementos: B. Alan Wallace argumenta que para uma melhor compreensão da mente, precisamos da “observação em primeira pessoa”, a introspecção. Olhar para dentro, para a nossa própria mente e consciência é a investigação mais profunda e genuína que podemos fazer. Mas, claro, uma introspecção investigativa não é qualquer introspecção. A mente comum, sem treino, é instável, distraída, cheia de “agitação e marasmo”. Para que possamos fazer preciosas descobertas, é necessário um instrumento refinado, como ele nos descreve: “Como o único instrumento de que a humanidade dispõe para observar diretamente a mente é a própria mente, é ela que precisa ser refinada.” – Ciência Contemplativa – B Alan Wallace, Capítulo 3 É aqui que as tradições contemplativas, com seus ensinamentos milenares e anos de experiência no treinamento da mente, se tornam parceiras essenciais da ciência. Seus métodos sofisticados nos ajudam a refinar a atenção, estabilizar a mente e cultivar a clareza mental necessária para a autopercepção e auto observação. Os Pilares que Sustentam a Ciência Contemplativa No coração da ciência contemplativa estão práticas e princípios que visam transformar a mente e, a partir disso, nos possibilitar perceber fenômenos que não são acessíveis somente pela observação externa. B. Alan Wallace destaca três pilares que sustentam esse processo, especialmente no contexto do budismo tibetano: 1.Shamatha (Treinamento da Atenção): Este é o fundamento. Antes de investigar a mente, precisamos ter uma ferramenta confiável para observá-la. Shamatha, que significa “quietude”, é a prática de estabilizar e refinar a atenção. Pense nisso como polir a lente do telescópio interior. Uma mente agitada ou entorpecida não consegue ver com clareza. O objetivo é desenvolver uma atenção que seja ao mesmo tempo estável (não se distrai facilmente) e vívida (clara e atenta). “Shamatha é um estado sereno de atenção em que os impedimentos da agitação e do marasmo foram totalmente acalmados. Os objetivos centrais de seu cultivo são desenvolver a estabilidade e a acuidade da atenção.” É um treino árduo, que envolve reconhecer e neutralizar a tendência da mente a divagar (agitação) ou a ficar opaca e sem energia (marasmo). Com a prática, a atenção se torna uma ferramenta poderosa para a auto-observação. – Ciência Contemplativa – B Alan Wallace, Capítulo 7 2. Vipashyana (Investigação Contemplativa): Uma vez que a mente está mais estável e clara, podemos usá-la para investigar a natureza da realidade, incluindo a natureza da própria mente e do “eu”. Vipashyana, ou “introvisão”, é sobre olhar profundamente, discernir, analisar a experiência vivida. Não é apenas pensar sobre algo, mas perceber claramente como os fenômenos surgem, permanecem e desaparecem na consciência. “A percepção do espaço absoluto pela consciência primordial transcende todas as distinções de sujeito e objeto, mente e matéria, na verdade, todas as palavras e conceitos.” – Ciência Contemplativa – B Alan Wallace, Capítulo 4 . Essa investigação pode levar a insights profundos sobre a impermanência, a interdependência de todos os fenômenos e a ausência de um “eu” fixo e independente, o que no budismo é chamado de vacuidade. É um conhecimento que não é apenas intelectual, mas experiencial. 3. Cultivo da Compaixão e
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